domingo, 17 de outubro de 2010

Por que ler?

Como havia prometido, trago aqui um segundo testemunho. O texto que posto a seguir pertence ao Guilherme Chacon, outro aluno do segundo ano do Ensino Médio (e que, por sinal, é da mesma turma da aluna Francine – post anterior). Achei legal colocar o texto dele logo após o da Francine para que se possam ter dois olhares sobre uma mesma questão. 

Francine, em seu texto, demonstrou um aspecto mais emotivo ao falar sobre a importância de ler, ou melhor, de gostar de ler, sem ter medo de enfrentar as trocentas páginas de um livro. Já o Guilherme traz uma visão mais racional e igualmente importante.

Por que ler? Bem, para essa pergunta, creio que muitos já saibam a resposta. Sim, todo mundo deve saber, de tanto que a suposta resposta para essa questão vive sendo repetida. Pela mídia, por professores, por qualquer pessoa que esteja atento ao que se fala diariamente, mecanicamente, insipidamente por tantos indivíduos.  

Fala-se muito por aí sobre a importância de ler. Dizem que isso é necessário para escrever bem, para se expressar bem. Para crescer como pessoa ou, pelo menos, para passar no vestibular. Exato. Isso é dito o tempo todo, para quem quiser ouvir. E talvez, por falarem demais, as pessoas não escutem devidamente.
Eu fico preocupada, pois sempre me estresso com coisas importantes que são banalizadas. Sei que é importante repetir que ler é importante, mas eu gostaria que as pessoas que falam isso o fizessem de forma menos mecânica, realmente acreditando em suas palavras, e não dizendo apenas porque ouviram alguém dizer e acharam isso bonito. Sabe, eu realmente gostaria que as pessoas que pronunciam essas palavras “ler é importante” o fizessem não para que essa informação entrasse por osmose na cabeça dos outros. Eu queria que essa frase fosse dita por quem realmente tivesse um testemunho a oferecer. Gostaria que quem falasse sobre a importância da leitura, tivesse uma história para contar. Porque só assim, essa informação deixaria de ser vazia, impessoal, distante e passaria a carregar um sentimento. 

E somente assim, essa verdade sobre a importância da leitura alcançaria verdadeiramente as pessoas. Afinal, como poderíamos sentir aquilo que não traz sentimento em si? Mais que uma questão de léxico, certas verdades precisam mais de sentimento em si, do contrário, não poderão ser devidamente sentidas e, por conseguinte, não teriam a necessidade de sentir.

Sim, é disso que sinto falta. De palavras menos vazias. De verdades preenchidas com sentimentos reais. De verdades verdadeiras.

O Guilherme escreveu um texto sobre algo que, para ele, é bem real. Eu sei. Em sala, ele sempre vem me falar ou sobre um livro que está lendo, ou sobre livros que ele quer ler, ou sobre livros que eu poderia sugerir a ele que lesse. 

E eu fico realmente impressionada em ver a velocidade com que ele lê. É daquele tipo de aluno que literalmente devora um livro. E com prazer. Por isso, emprestei a ele um livro chamado Fahrenheit 451, do Ray Bradbury. Eu li esse livro quando fazia meu curso de Letras, em uma matéria que trabalhava a importância de se relacionar Educação e Literatura. Lembro-me de como me senti marcada por ele. Por isso, é um livro que costumo emprestar para alunos que sinto serem capazes de se marcarem por ele como ocorreu comigo.

O livro, para quem quer saber, fala sobre um futuro em que livros são proibidos. Exatamente; uma época em que ler se tornou proibido. E por quê? Porque ler é a principal ferramenta para se criar um ser pensante, crítico. Nesse livro, pessoas capazes de pensar por conta própria são consideradas subversivas e, portanto, perigosas. Chega a ser surreal; quando se descobre, nessa sociedade futurista, que alguém esconde livros em casa, bombeiros são enviados para lá às pressas, a fim de queimarem essas obras. O número 451 refere-se à temperatura (em Fahrenheit) em que o papel incendeia.

Fica a dica de leitura para quem se interessar. O Guilherme, para variar, leu muito rápido. E, por encomenda minha, escreveu um texto no qual ele disserta sobre o porquê de se ler, sobre a importância da leitura na vida de uma pessoa. Ele utiliza os argumentos já conhecidos, mas em suas palavras, é possível ver que ele não é apenas mais um papagaio que apenas repete o que ouviu de outros. O Guilherme lê. E, por meio de ironias e frases de que muito gostei, ele consegue passar essa visão de quem realmente sabe do que está falando:

“Por que ler?

         É cada vez mais comum notar pessoas passarem seu tempo livre vendo televisão, deixando-se levar pelas opiniões que veem nos programas em vez de formular um próprio ponto de vista. Além disso, a facilidade dos fones de ouvido acabou tornando as pessoas reduzidas a um mundo diminuto e limitadas ao que as diverte; perdendo, consequentemente, o senso crítico. Ou seja, as formas de entretenimento mais presentes são, atualmente, as mais fáceis e as mais frívolas (televisão e música). No entanto, é cada vez mais difícil encontrar pessoas que leem - não por obrigação - em seu tempo livre.

         Por isso mesmo é importante ler. A partir do momento que a maioria das pessoas não leem e estão alienados pelos outros meios de entretenimento, ler se torna algo diferencial. Ademais, a mesma diversão que se pode conseguir assistindo televisão ou ouvindo música, consegue-se lendo livros. A diferença é: o que se ganha assistindo TV ou ouvindo música além da diversão?

         Bem, assistir televisão e ouvir música é, com certeza, mais rápido e fácil. Justamente, por causa desse “imediatismo” que as pessoas preferem isso a ler um livro. Realmente, é uma maneira bem divertida de se ficar excluído e perder o próprio senso crítico. 

         Do outro lado, ler um livro é uma outra via, de certa forma oposta, para se passar o tempo livre. Além de todos aqueles clichês, que todos já estão cansados de ouvir - maior vocabulário, melhor escrita, maior contato com culturas diferentes - sobre a importância da leitura, ler é interessante, principalmente, pelo fato de trazer a mesma diversão que uma música ou programa de televisão e, ademais, ativar a mente. Durante uma leitura, há um diálogo contínuo entre os pensamentos e o livro que, no final, estimula o senso crítico e a formação de vários pontos de vista. Além, é claro, de todo o conforto e prazer do momento da leitura. Em suma, ler é uma vantagem perante o resto e é também prazeroso.

            A escolha sobre como passar o tempo livre é individual: ou ficar reduzido à exclusão das massas ou ser diferencial e racionalmente ativo.”

Eu gostei muito do fato de ele mencionar a questão da TV e da música. Por favor, entendam bem. Não estamos aqui discriminando nem uma nem outra. Mas a questão é simples. Ler ainda é uma tarefa que exige mais. Exige capacidade de abstração. Exige a capacidade de a pessoa conseguir ficar bem sem mais ninguém. Sem que haja outras vozes, senão a sua própria. 

Essa é uma das maiores dificuldades em se ler. A maioria das pessoas, nos dias de hoje, tem dificuldades de estarem sós. Algumas pessoas talvez digam que não, que podem perfeitamente assistir à TV sozinhas, ou que gostam de escutar música sozinhas.

Entretanto, a verdade é por esses meios de comunicação, a mensagem, a emoção e o prazer são levados ao seu interlocutor por uma voz ou por uma imagem que já facilitam a recepção desse prazer. Volto a dizer; isso não desmerece o prazer causado por essas formas de entretenimento. Mas são menos difíceis de se obter.

Quando se lê, lê-se realmente sozinho (a não ser que alguém leia para você, mas aí é outra história). É você, e você apenas, entrando em um mundo que somente você pode construir. As frases, as palavras escritas naquela folha terão o peso da emoção que você quiser dar a elas. Os personagens terão o rosto e as vozes que você der a elas. Mesmo que se descreva tudo isso na história, ainda assim, o mundo que você criar a partir da sua leitura será seu, e apenas seu.

E, por ser uma atividade solitária, ao término da leitura, as impressões que lhe ficarem serão suas. Alguém pode até querer vir dizer a você algo sobre o livro, mas ninguém jamais poderá lhe dizer como se sentir após lê-lo. Isso pertencerá apenas a você.

Com tantos personagens e mundos que você, ao ler um livro, é obrigado a construir, você acaba fazendo parte deles assim como eles passam a fazer parte de você. É quando você deixa de ser um e passa a ser vários. É quando se descobre a possibilidade de ver uma mesma coisa por várias outras perspectivas. E isso faz com que você se torne uma pessoa mais crítica, mais reflexiva. 

É uma tarefa árdua, não se pode mentir. Ler é manter-se racionalmente ativo – adorei essa parte do texto do Guilherme, por ser a mais pura verdade, Aliás, ele mesmo definiu com excelência a forma como essa leitura ativa faz do leitor um pensador independente: Durante uma leitura, há um diálogo contínuo entre os pensamentos e o livro que, no final, estimula o senso crítico e a formação de vários pontos de vista.
 
Reconheço que executar esse tipo de leitura dá mais trabalho, mas... aquilo que nos exige mais, que nos dá mais trabalho, que nos força ao máximo que podemos oferecer... não é daí que costuma vir o que há de melhor na vida? 

Por isso, eu gostei do modo racional como o Guilherme quis ponderar as coisas. Ouvir música, ver um filme... isso nos causa prazer, sem dúvidas. Ler um livro também. Porém, com o livro, você deve exigir mais de outras capacidades suas, que devidamente trabalhadas fazem você crescer como pessoa. Logo, há um ganho a mais, fora o simples prazer adquirido.

Por tudo isso, ler é importante.

Simples assim.

Obrigada, Guilherme.

PS 1: Para quem se interessar e quiser entrar em contato com o Guilherme Chacon, procurem por Chacon Guilherme no Orkut.

PS 2: Algumas pessoas perguntaram, então aproveito para responder por aqui mesmo. Sim, esse blog é válido para ex-alunos meus, sejam eles de colégio ou de cursinho pré-vestibular. É só entrar em contato comigo e manifestar a vontade de participar, que eu retorno assim que puder. (de preferência, entre em contato pelo Twitter: @CamillaYoshico)

Até a próxima! =D

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Desperdício de prazer

Para abrir esse blog, trago a contribuição de uma aluna que está no segundo ano do Ensino Médio. A aluna Francine foi escolhida porque ela me trouxe uma imensa felicidade...

Aqui em Brasília, o Programa de Avaliação Seriada (PAS) recomenda a leitura de certas obras, que devem ser lidas pelos alunos ao longo do ano, a fim de se prepararem apropriadamente para esse mini-vestibular. São muitos os livros requisitados, mas me surpreendi ao ver na lista de 2010 a obra Os Miseráveis, de Victor Hugo. O livro é excelente, pertence ao período romântico que é estudado por esses alunos e é simplesmente um dos grandes clássicos da literatura mundial.

Contudo, é um livro grande. Tem por volta de 1300 páginas. Algumas editoras até preferiram dividi-lo em dois volumes, tamanha a extensão da obra.

Por isso, como não podia deixar de ser, para salvar aqueles alunos que por um motivo ou por outro não conseguem ler a obra na sua versão integral, surgem as versões adaptadas, que trazem um resumo do enredo.

Esse resumo pode até ser bastante funcional e, talvez, até sirva de alguma ajuda para o aluno que deseje fazer uma prova razoável no final do ano. Mas, como sempre digo, a leitura do resumo pode ser funcional, mas jamais é tão prazerosa quanto a leitura de sua história na íntegra. E aí, acaba acontecendo o de sempre: o aluno lê o resumo, sabe de que se trata a história, faz a prova... mas perdeu a chance de se apaixonar pela trama, pelo estilo do autor e por tantas outras coisas que evito falar agora, porque quero dar a palavra à minha aluna Francine:

           "Sempre amei ler, e já li vários livros muito bons. Mas nunca pensei que um “livro de escola” ia se transformar em um dos meus livros favoritos. Talvez, ao ler Os Miseráveis, eu tenha tido a catarse mais profunda. E só entende quem leu a versão integral. Sabe quando ao terminar de ler um livro você sente aquela sensação de alívio, de pureza na alma, de leveza? Preciso dizer também que esse livro foi um dos poucos que me fez chorar, me emocionar. Aquele que você precisa parar de ler, pois seus olhos já estão completamente cheios d'água, mas ao mesmo tempo você não QUER parar, pois precisa saber o que está por vir.


             De todas as cenas, a que mais me marcou foi quando Jean Valjean entregou a boneca para a Cosette. Uma cena tão trabalhada, tão cheia de detalhes, tão carregada que você consegue se enxergar naquela sala, ao lado do Jean, vendo o sorriso se abrir no rosto da pequena Cosette e depois se sentir brincando com ela. A sensação de ler a mesma cena na versão resumida foi completamente contrária, mas igualmente forte - de indignação, de não acreditar que uma cena que te comoveu tanto foi assim tão friamente contada. 

             Desapontada, continuei lendo e cheguei em outra parte que eu tinha amado no livro e que, adivinha, foi outra grande decepção. O beijo de Marius e Cosette. Tão perfeito no livro, tão ridículo no resumo. E digo ridículo, porque apesar de ser muito forte, não há melhor palavra. Pareceu que a Cosette estava sendo obrigada a “amar” Marius.

             Jean Vajean foi minha grande inspiração no livro. Como ele muda a si próprio e a todos que estão ao seu lado. Como ele, apesar dos preconceitos da sociedade, dá a volta por cima de todas as dificuldades. Sua honestidade, seu caráter, suas atitudes. No resumo, tudo isso não tinha como ser mais supérfluo. Os atos de Jean Valjean são relatados como se fossem a coisa mais normal do mundo e não dá a possibilidade do leitor de se envolver com ele. É como se fosse outro homem qualquer, agindo como outro homem qualquer, vivendo como outro homem qualquer. E quem leu a versão de 1300 páginas sabe muito bem que tá longe de ser assim.

             E essas 1300 páginas? Resumidas a 100. Toda a essência do romance foi perdida. As críticas foram deixadas de lado, as emoções também. A história veio mastigada. Foi como ler um livro da 4ª série. E o que me impressiona é que muitos alunos do 2º ano do Ensino Médio, que estão prestes a decidir seu futuro, leram esse livro. Pra mim, isso parece absurdo.

             Sobre o que eu senti ao terminar de ler a obra original e o resumo, respectivamente:

1) ficou a estranha sensação de que tudo estava completo, mas ao mesmo tempo vazio. Estava ali uma obra que faz você perceber de uma maneira completamente diferente o mundo ao seu redor; e também um romance que faz você perder seu chão durante semanas.
2) decepção.

             E para explicar a decepção, me deixe exemplificar. Imagine cada livro como se fosse um mar. Os Miseráveis como se fosse uma das partes mais profundas deste. A partir do momento que você perde o medo do desconhecido e mergulha nessa imensidão, a cada olhar lançado consegue se perceber beleza presente por todos os cantos. Mas o mais importante é o que você aprende nesse mergulho: a apreciar a profundidade do mar e a não se contentar com as coisas rasas."

Comecei esse texto dizendo que a aluna Francine me trouxe uma imensa felicidade. É verdade, ela me trouxe um sorriso em meio à tristeza que eu vinha sentindo quando anunciei em sala que os alunos deveriam ler a versão integral de Os Miseráveis. Escutei muitas reclamações, todas ligadas ao fato de a obra ser muito grande. Isso me chateou, porque estava difícil fazer com que eles se abrissem a uma experiência que, eu sabia muito bem, seria gratificante. Se eles ao menos dessem uma chance...

Foi aí que, dias depois, Francine apareceu, vindo atrás de mim - como sempre faz - serelepe e empolgada, dizendo que já havia comprado o livro e que já tinha começado a ler. As amigas vieram junto, confirmando o que ela dizia e acrescentando que ela não conseguia parar de ler, chegando ao ponto de ler enquanto as outras pessoas faziam outras coisas e dando gritos de emoção em certas partes da obra, assustando quem estava ao redor.

Eu sorri com esse comentário, e internamente eu senti que nada estava perdido. Francine me deu a esperança, que estava meio abalada, de fazer com que os outros colegas dele lessem e quiçá se apaixonassem também. 

Dito e feito. Mais alunos leram, mais alunos amaram, mais alunos vieram me dizer o quanto essa experiência foi gratificante. 

Valeu a pena. 
Valeu a pena, principalmente, por ler a metáfora fantástica da aluna comparando um livro ao mar. Eu amo mar, eu amo água e não sei se ela fez de propósito, mas me ganhou com isso. 

Por isso, sei que acertei quando pedi à aluna que escrevesse um texto comparando Os Miseráveis em sua versão integral com a versão resumida. Que fique claro; não é nosso interesse depreciar os resumos feitos por tantas pessoas que se prestam a esses trabalhos, que são árduos, sim. Entretanto, era nosso desejo mostrar quão enganados estão aqueles que pensam que um resumo ou uma versão adaptada substitui a leitura de um livro. 

Estou satisfeita. Acho que o ponto foi alcançado.

Obrigada, Francine.

PS 1: Para quem quiser entrar em contato com a aluna Francine, ela está no twitter: @franvilhena

PS 2: Se alguém tiver interesse em participar desse projeto, entre em contato que eu lhe responderei assim que possível.

PS 3: Importante frisar - Esse blog é feito para divulgar apenas textos dos meus alunos. Por melhores que sejam, não divulgarei aqui textos de desconhecidos, ok?

PS 4: E o meu e-mail para contatos é camilla_shimabuko@yahoo.com.br. No twitter, podem me localizar como @CamillaYoshico. No orkut, procurem por Camilla Shimabuko. Deixem um toque em qualquer desses lugares, dizendo que quer ver um texto seu nesse blog, comentado e revisado por mim. (coisa chique, hein?)

PS 5: Aguardem! Dois novos textos já estão no forno. Os dois alunos já foram contatados e estão em processo de produção de seus textos. Tão logo eles me passarem, colocarei aqui para serem devidamente apreciados...

Até lá! =D

Sobre este Projeto, LEIA-ME:

Meu nome é Camilla, tenho 28 anos e sou professora de Literatura. Sou professora porque amo lecionar e vivo da Literatura porque sempre achei que viver uma única vida seria limitado demais para mim. Aprendi a ser, de forma mais plena, quando comecei a vivenciar outras existências. Assim, eu alcanço outros seres que descubro viverem dentro de mim toda vez que leio um novo livro. Ao ler e contar histórias, eu descubro e redescubro, amplio meus horizontes, torno-me uma pessoa sempre nova... São muitos os benefícios e prazeres que a leitura pode trazer.

Se é assim, por que então é tão comum as pessoas, especialmente os jovens de hoje, dizerem com tanta convicção que ler é ruim? Está certo; alguns dizem que somente os clássicos da Literatura, obrigatórios nas escolas, são ruins. 

Será mesmo?

Recuso-me a aceitar essa afirmação. Os clássicos da Literatura, seja ela brasileira ou mundial, são clássicos por algum motivo válido. Como professora de Literatura, acredito que esse seja um dos meus maiores objetivos a alcançar em sala de aula: explicar o porquê de tal obra ser considerada um clássico, mas mais importante que isso – fazer o aluno não só compreender isso, mas partilhar dessa visão.

Algumas pessoas podem achar que não alcançarei êxito nessa empreitada. Diriam talvez que os adolescentes não tem interesse nesse tipo de Literatura, preferindo os best-sellers que surgem eventualmente. E, a partir desse ponto, é comum surgirem discussões sobre o que é Literatura de fato, o que pode ser considerada boa literatura, o que não pode... Enfim; é uma discussão que se estende por demais e eu não vou entrar no mérito dessa questão. A mim, interessa apenas uma coisa: Se meus alunos têm interesse em ler livros que são recordes de vendas, então nada impede que eles se apaixonem também pelos clássicos.

Não; não é um sonho absurdo, nem um ideal inatingível. Não estou superestimando ninguém aqui. Não desconheço minha realidade. Em minhas aulas, sempre percebo que muitos alunos acabam se deixando envolver rápido demais por esse sentimento de “não conheço e não gostei”. É normal que eles já tenham ouvido falar de autores renomados, de importantes títulos de obras que eles deverão conhecer para fazer a prova do vestibular... E, por conta disso, terminam criando traumas e preconceitos a respeito de algo que nem viram a fundo. Tudo isso, junto ao fato de que os livros remontam, muitas vezes, a séculos passados e utilizam uma linguagem mais refinada, acaba por afastar leitores em potencial dessas obras fantásticas. Se fosse dada apenas uma chance, se vários alunos deixassem-se levar mais pela curiosidade, se a vontade de conhecer fosse maior que esses preconceitos bobos... Quantos livros maravilhosos não seriam descobertos! E como uma disciplina escolar, às vezes, mal-vista e mal-quista, poderia se tornar em um imenso prazer a partir de então...!

Pois bem. Façamos da Literatura uma paixão! Como?

- O primeiro passo é derrubar esses preconceitos.

- O segundo é mostrar que só porque o livro está sendo estudado na escola, não significa que ele tenha de ser ruim, enfadonho, cansativo.

Para obter sucesso nessas duas primeiras etapas, o professor deve trabalhar arduamente em sala de aula. E ele perceberá que está conseguindo o que intenta quando alguns alunos vierem lhe dizer que gostaram da obra, que sentiram curiosidade de conhecer mais a fundo o autor e outros livros dele. Localizando, dessa forma, esses alunos, o professor terá em mãos seu principal instrumento. Não mais será o professor quem dirá que tal livro é bom; será o próprio aluno a testemunha disso tudo. Alunos que se sensibilizarem com a obra, demonstrando realmente entender o valor que ela carrega, permitindo apaixonar-se por ela, identificar-se, aprender, crescer com ela; essas serão as principais ferramentas para que eu possa demonstrar que a Literatura é tão apaixonante como gosto tanto de apregoar.

Uma vez encontrados tais alunos, o passo seguinte é divulgar o sentimento desses alunos para o máximo de pessoas possível, comprovando que o jovem de hoje ainda possui sensibilidade, ainda é capaz de perceber o valor de uma obra do século passado, compreendendo que a leitura é um prazer que independe da época.
E para isso servirá esse blog. Em sala, venho conversando com alguns alunos e pedindo que me mandem textos a respeito de algum tema passado por mim. Desejo, aqui, expor o que eles pensam e sentem a respeito de assuntos diversos ligados à Literatura. É também um espaço em que alguns alunos poderão apresentar seus trabalhos originais (contos, poemas, crônicas...).  Sempre identificarei o aluno autor do texto, deixando, quando possível, alguma forma para quem estiver lendo entrar em contato com ele, caso queira. Mas ressalto que o objetivo do blog é a discussão, é o testemunho do amor pela leitura, é a divulgação das palavras inspiradoras de alunos meus. Mas tudo isso não pode ser visto como o final de um processo. 
Quando muito, isso aqui deve ser um trampolim, um início, um começo de uma carreira que pode ganhar asas se o próprio aluno se esforçar em divulgar e publicar seu trabalho.

Resumindo... Esse blog é uma extensão do trabalho feito em sala de aula. É uma tentativa de valorizar aqueles alunos que já são apaixonados pela Literatura e tentar, quem sabe, atrair mais alguns para compartilharem dessa paixão. 

Espero que esse projeto tenha vida longa... e sejam todos bem-vindos a essa Sociedade das Mentes Escritoras.